Antonio Gonçalves Filho
Partilhando o que melhor se produz em arte, 67 galerias mostram mais de 2 mil obras na quarta edição da feira internacional
Nesta quarta edição da SP Arte, que reúne 67 galerias e 2.400 obras de arte, seria lícito perguntar se uma feira como esta, destinada à difusão da arte e promotora do colecionismo, não busca, antes, fornecer uma resposta sobre o lugar da criação artística num país de agudos contrastes sociais. Assim como nossos artistas modernistas resolveram sua crise de identidade elegendo um passado idealizado, ao incorporar conquistas estéticas da vanguarda européia do começo do século 20, o mercado brasileiro atual busca na obra de arte contemporânea um veículo de reconciliação social e geopolítica. Em resumo: a cada edição, atraindo não só galerias de várias regiões brasileiras, mas um número cada vez maior de marchands estrangeiros, dispostos a dialogar com a arte brasileira, a SP Arte aprimora seu papel como veículo de uma reconciliação por meio da arte. Durante a semana de realização da feira, num mesmo território, artistas de diferentes tendências, colecionadores dos mais variados perfis e galeristas de diversas vocações criam uma zona de transcendência dentro do pavilhão da Bienal, partilhando o que de melhor se produz em arte.
Após quatro anos, a idealizadora dessa feira, Fernanda Feitosa, diz, orgulhosa, que, ao facilitar esse acesso a um número cada vez maior de visitantes, a SP Arte ajuda a criar não só um território espacialmente qualificado como um território de identidade para a arte brasileira. Na primeira edição, em 2005, alguns galeristas respondiam ao convite de participação com uma pergunta: Por que participar da feira e de onde viriam, afinal, os novos clientes? Os números se encarregam de fornecer a primeira parte da resposta: foram 6 mil visitantes na primeira, 7 mil na segunda, 9 mil na terceira e, possivelmente, o dobro da feira inaugural nesta quarta edição. Quanto aos novos clientes, as próprias galerias dão uma resposta estimulante: ao expor, por vezes, obras de um mesmo artista representado em mais de um espaço, elas acabam criando para o visitante um museu temporário, capaz de fornecer dados aos colecionadores neófitos que, de outro modo, teriam de gastar horas incontáveis atrás de informações, que a feira acaba fornecendo num curto período de tempo e espaço (pouco mais de 6 mil metros quadrados este ano).
É claro que não seria seguindo um modelo surrado que a feira teria conseguido em quatro edições atrair novos clientes para as galerias e ainda promover artistas emergentes. A organizadora da SP Arte diz que jamais perseguiu o modelo da Arco ou de Basel, simplesmente por não acreditar numa idéia de franquia multinacional da arte em tempos de globalização e decomposição da educação artística. "O perfil que sempre perseguimos foi o do neófito não-familiarizado com o mercado, que tem real interesse em arte, mas fica inibido diante de uma galeria", define Fernanda Feitosa, argumentando que o ambiente descontraído da SP Arte democratiza o acesso do público à arte e desfaz a idéia do artista como demiurgo criador de formas incompreensíveis. Como prova dessa orientação quase pedagógica da feira, sua idealizadora cita as palestras de críticos, historiadores de arte e artistas, programadas em todas as edições, bem como as retrospectivas que, desta em diante, poderão ajudar na tarefa de orientar o olhar do novo colecionador. "Em conjunto como Sesc e a Associação Videobrasil, vamos promover, no Museu de Arte Moderna, uma mostra com os vídeos premiados nos últimos 20 anos do festival", revela, com justificado entusiasmo. Afinal, foi o Videobrasil que trouxe ao País obras de criadores como os videomakers Bill Viola, Gary Hill e o desenhista sul-africano William Kentridge, entre outros.
Ela mesma uma colecionadora que começou há apenas dez anos a comprar obras de arte, reunindo um respeitável acervo de pinturas de Volpi e esculturas de Amilcar de Castro e Ernesto de Fiori, Fernanda Feitosa atribui ao contato com galeristas e amigos a desmistificação da idéia de mercado de arte como uma cultura opressiva que afasta possíveis interessados. É uma falácia, segundo a advogada, que trocou de profissão ao freqüentar a feira de arte contemporânea de Buenos Aires quando morava na Argentina, há oito anos. Animada pelo marchand e amigo Paulo Kuczynski, ela começou a pensar num modelo alternativo brasileiro em 2004 e, no ano seguinte, mesmo sem patrocínio, alugou parte do pavilhão da Bienal para fazer a primeira edição da SP Arte, convidando para um debate (sobre arte, arquitetura e sobrevivência dos museus) o escultor José Resende e o premiado arquiteto Paulo Mendes da Rocha, entre outros.
Esse aspecto educacional chamou a atenção da mídia e se fortalece a cada nova edição. A deste ano terá um ciclo de palestras aberto ao público no auditório Lina Bo Bardi, do Museu de Arte Moderna, do qual irão participar nomes como Tanya Barson, curadora internacional da Tate Gallery de Londres, e o especialista em conservação de obras de arte Stephan Schäfer, da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade de Lisboa. Além deles, virão como convidados diretores de museus latino-americanos como o de Lima, o argentino Macla e europeus (Tate e Pompidou). Jornalistas da Alemanha, Chile, Espanha e Itália irão cobrir a SP Arte, que nesta edição tem sete galerias estrangeiras participantes: a Sur (Uruguai); Mário Sequeira (Portugal); Isabel Aninat e Florencia Loewenthal (Chile); Sycomore Art (França), Jorge Mara-La Ruche e GC Estudio de Arte (Argentina).
Publicado em 14/5/08
Fonte: Revista Bravo! / Revista SP Arte
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